segunda-feira, 16 de maio de 2011

Ministério do Meio Ambiente alerta que texto de Aldo sobre Código Florestal estimula crime ambiental

O Ministério do Meio Ambiente enviou nesta sexta-feira à Casa Civil levantamento apontando pelo menos dez problemas no texto que o relator do Código Florestal, deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), queria votar na quarta-feira à noite, sendo o mais grave a inclusão de anistia a desmatadores – que a presidente Dilma Rousseff havia prometido vetar ainda na campanha eleitoral. Outro ponto do relatório de Aldo, classificado pelo ministério como desastroso, é abertura de crédito a produtores que cometeram infrações ambientais. Reportagem de Catarina Alencastro, em O Globo.
- Voltamos à situação em que o crime ambiental compensa. A implicação prática disso é desastrosa – disse nesta sexta-feira João de Deus Medeiros, diretor do Departamento de Florestas do Ministério do Meio Ambiente, representante do ministério nas negociações sobre o Código.
As mudanças de última hora feitas por Aldo eram de conhecimento do líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP). Mas outra versão tinha sido apresentada antes ao líder do PT, Paulo Teixeira (SP). O relatório do ministério encaminhado à Casa Civil é mais um sinal de que um entendimento ainda está longe.
Texto permite crédito a infrator
No texto de 36 páginas levado à votação, foi incluído um parágrafo (o 5º) no artigo 33. Embora a redação do trecho seja confusa, técnicos do MMA entendem que, na prática, o texto diz que todas as multas serão suspensas mediante recuperação de áreas desmatadas – com o que o governo concorda. Mas, ao mesmo tempo, legaliza as chamadas áreas consolidadas, ao desobrigar o produtor de reflorestá-las. Áreas consolidadas são as de vegetação nativa (floresta) convertida em plantio ou pasto até julho de 2008.
- Ou você faz uma coisa ou outra: recuperar áreas consolidadas e ao mesmo tempo mantê-las são coisas incoerentes, incompatíveis. É dar anistia. O governo nunca trabalhou com essa hipótese – disse Medeiros.
O Meio Ambiente questiona ainda a decisão de Aldo de retirar do texto um artigo inteiro, o 58, que tornaria impossível a concessão de crédito rural para quem tiver infração ambiental confirmada em decisão definitiva de procedimento administrativo. O ex-ministro do Meio Ambiente Carlos Minc (PT-RJ) também disse nesta sexta-feira que a retirada desse mecanismo “é muito grave”:
- Você continua financiando o destruidor do meio ambiente. Corte de crédito a desmatadores foi essencial para termos chegado à menor taxa histórica do desmatamento na Amazônia. Se isso for mesmo alterado, não vamos continuar conseguindo combater o desmatamento nem na Amazônia, nem no cerrado, nem na caatinga.
Vaccarezza e Aldo argumentam que o texto a que os líderes partidários tiveram acesso algumas horas antes de o relatório de Aldo ser lido no plenário era apenas um conjunto de propostas do governo, e que não houve acordo final em torno dele. E que só Aldo, como relator, tem autonomia para acatar ou rejeitar tais sugestões.
- A Casa Civil nunca fez relatório para o Aldo. Quem fez o relatório foi o relator. O governo pode sugerir propostas a ele, mas a Casa Civil não era relatora. Não houve texto de acordo na Casa Civil. O governo apresentou uma proposta ao relator – afirmou Vaccarezza. – O texto que entreguei na mão do Paulo Teixeira, eu pedi para ele ler e rasgar. E para não divulgar. Esse texto seria sugerido ao Aldo. Depois disso, eu, Aldo e os líderes discutimos. A maioria das sugestões, o relator aceitou; outras, não – disse Vaccarezza.
Uma terceira questão problemática apontada pelo estudo do MMA está no artigo 3 do texto de Aldo: ao suprimir o trecho que estabelecia que a previsão de “pousio” (descanso que se dá a pastos e lavouras) é apenas para pequenos agricultores, fica em aberto que a prática deve ser obedecida por todos. Na avaliação técnica do MMA, grandes produtores mal intencionados poderão fazer desmatamentos em novas áreas, e justificá-los como sendo pousios. E o poder público não terá como fiscalizar isso.
DEM quer votar projeto terça-feira
O governo ainda não decidiu como procederá daqui para a frente em relação ao texto. Dá sinais, porém, de que continuará tentando eliminar suas diferenças com o relator e usará a próxima semana para essa negociação, já que a Câmara estará esvaziada pela ausência de seu presidente, Marco Maia (PT-RS), e dos líderes de PT e PMDB. O DEM, entretanto, apresentou nesta sexta-feira requerimento convocando sessão extraordinária para a matéria ser votada terça-feira.
Além das polêmicas de mérito, a discussão do Código Florestal provocou ruído entre Aldo Rebelo e a ex-senadora Marina Silva também difícil de ser solucionado. Nesta sexta-feira, o deputado repetiu que pediria desculpas a Marina, mas negou que tenha errado ao evitar, como líder do governo em 2004, o depoimento do marido da ex-senadora, Fábio Vaz, à época acusado de se envolver num suposto esquema de contrabando de madeira. Segundo ele, o caso já estava sendo apurado em outro âmbito, e a oposição queria usá-lo para provocar o governo na Câmara:
- A investigação estava em curso no Ministério Público. Queriam fazer uma provocação política com o governo. O objetivo de investigar já estava sendo cumprido.
Mas Aldo negou que tenha articulado com a bancada governista para que o caso fosse abafado na Câmara, apesar de ter dito isso na quarta:
- O requerimento foi retirado de pauta porque o proponente estava ausente.
EcoDebate, 16/05/2011
[ O conteúdo do EcoDebate é “Copyleft”, podendo ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, ao Ecodebate e, se for o caso, à fonte primária da informação ]

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Votação do Código Florestal está adiada indefinidamente, diz líder do governo na Câmara


Publicado em maio 13, 2011 por HC

Obstrução dos partidos da base aliada impediu que a proposta fosse analisada na quarta-feira; oposição quer votar o texto na próxima semana
O líder do governo, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), disse que o projeto do novo Código Florestal (PL 1876/99) não deverá ser votado na próxima semana. Segundo ele, não há previsão, por parte do governo, para a proposta do novo código entrar novamente na pauta do Plenário.
A razão é que o Executivo quer que sejam votados pelo menos três das oito medidas provisórias (MPs) que perdem a validade no dia 1º de junho. Vaccarezza disse que havia um acordo com a oposição para votar o código antes das MPs, mas que a discussão de quarta-feira (11) demonstrou não ser possível votar um projeto tão polêmico de forma apressada – devido à obstrução da base aliada, o Plenário acabou não votando a proposta.
No entanto, o líder do PSDB, deputado Duarte Nogueira (SP), que está no Acre, afirmou por meio de nota que seu partido quer que o Código Florestal seja votado na próxima semana. “Há um acordo em torno disso. O governo não pode simplesmente querer inverter a ordem das matérias porque sua base está desalinhada”, disse.
Vaccarezza disse que vai abrir uma negociação com a oposição para avançar nas votações de MPs, e acredita que não haja grandes dificuldades, uma vez que, apesar das disputas políticas em torno da flexibilização de licitações para as obras da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016, incluídas na MP 521/10, as reivindicações da oposição podem ser atendidas.
Além disso, o líder lembrou que o presidente da Câmara, Marco Maia, não estará no Brasil na semana que vem – ele viajou nesta quinta-feira para participar da 2ª Cúpula Parlamentar do G-20, na Coreia do Sul. “Não que outros deputados, ou a presidente em exercício, Rose de Freitas, não tenham competência para conduzir os trabalhos, mas numa pauta tão polêmica, precisamos do titular de um poder para tomar as decisões”, ponderou.
As MPs que o governo quer votar antes são:
- 517/10: reduz a zero o Imposto de Renda incidente sobre os rendimentos de títulos privados se o comprador residir no exterior;
- 520/10: cria a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) para apoiar os hospitais universitários federais;
- 521/10: traz emenda que cria um regime especial para a licitação das obras da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016. Originalmente, a MP trata do valor da bolsa de médico residente, além de garantir licença-maternidade e paternidade a esse profissional.
Acordo descumprido
Para o líder do PPS, deputado Rubens Bueno (PR), o adiamento da votação da proposta relatada pelo deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) deve ser debitado na conta do Palácio do Planalto, “que descumpriu acordo fechado com todos os líderes partidário e correu da votação por não conseguir controlar uma base parlamentar construída por meio do fisiologismo”. Ele afirmou que a relação de confiança entre as lideranças é de fundamental importância para o bom funcionamento da Casa.
“A votação do texto principal e de um destaque da oposição foi acordada com o líder do governo [Cândido Vaccarezza]. Quando chegamos ao plenário, o governo adia a votação. Foi algo que nunca se viu aqui no Parlamento do ponto de vista da palavra e do compromisso. Quebrando essa linha de confiança e é evidente que teremos agora uma relação mais tumultuada entre governo e oposição”, previu Bueno.
O Psol, que apresentou requerimento de retirada de pauta do projeto na sessão de quarta-feira, divulgou nota criticando diversos pontos do relatório de Aldo Rebelo. Para o partido, as últimas alterações no texto feitas por Rebelo “enfraquecem o controle ambiental”.
Deputado do PV, que apoiou o adiamento da votação, Alfredo Sirkis (RJ) também criticou o relatório. “Não podemos correr o risco de aprovar um texto assim, sem conhecermos os detalhes da proposta, apenas para depois fazer a delícia dos advogados dos grandes desmatadores”, afirmou.
Reportagem – Marcello Larcher
Edição – Marcos Rossi
Reportagem da Agência Câmara de Notícias, no EcoDebate, 13/05/2011
[ O conteúdo do EcoDebate é “Copyleft”, podendo ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, ao Ecodebate e, se for o caso, à fonte primária da informação ]

terça-feira, 10 de maio de 2011

Por que eles querem mudar o Código Florestal‏?

Preocupados com o próprio bolso, Aldo, Cassol, Irajá, Quartieiro, Queiroz e Campos representam tudo o que um parlamentar jamais deveria fazer: legislar em causa própria.

A regra deveria ser: deputados e senadores eleitos pelo povo devem zelar pelo bem comum, certo? Nem sempre. Caso emblemático é a insistência de alguns políticos em aprovar a toque de caixa o projeto de lei que institui o novo Código Florestal. Pra que tanta pressa? Segundo reportagem da Istoé , a explicação é simples: legislar em causa própria e proteger o próprio bolso. Os interesses de pelo menos 27 deputados e senadores não passam nem perto do bem da nação.

A revista revela que, caso o projeto de lei do Código Florestal seja aprovado, os ilustríssimos políticos listados se livrarão de multas pesadas e se beneficiarão por desmatarem ilegalmente. De acordo com a reportagem eles já foram punidos pelo Ibama por agressão ao meio ambiente e o novo código que queriam aprovar a toque de caixa prevê anistia para multas impostas a desmatadores. O benefício se estenderia também a empresas e empresários do agronegócio que, nas eleições do ano passado, fizeram pesadas doações a esse bloco parlamentar ligado à produção rural.

O deputado Paulo César Quartiero (DEM-RR) é um exemplo típico. Campeão de infrações, ele foi multado em R$ 56 milhões por eliminar 2,7 mil hectares de vegetação sem autorização em Pacaraima (RR), destruir outros 323 hectares de vegetação nativa e impedir a regeneração em mais 3,5 mil hectares. Foram duas infrações em 2005 e mais duas em 2009.

O Ibama também pegou o deputado Irajá Abreu (DEM-TO), filho da senadora Kátia Abreu (DEM-TO), que foi multado no ano passado por desmatar uma propriedade em Tocantins.

O senador e fazendeiro Jayme Campos (DEM-MT) é outro que se inclui na turma da motosserra. Foi multado em R$ 5 milhões por quatro infrações impostas em 2004 e 2005.

O interesse do bloco ruralista vai além. Eles também defendem seus financiadores de campanha. Empresas ligadas ao agronegócio doaram pelo menos R$ 45,5 milhões para deputados e senadores nas eleições do ano passado segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral.

Reportagem parecida foi produzida pelo Correio Braziliense no dia 19 de abril. O texto afirma que os ruralistas têm mesmo motivos para impor as mudanças que põem abaixo o Código Florestal. Pelo menos 15 deputados federais e três senadores da bancada da motosserra seriam beneficiados com a alteração da lei. Multados pelo Ibama por crimes ambientais, eles teriam essa mancha apagada de suas fichas caso a proposta seja aprovada.

fonte:http: //www.greenpeace.org/brasil/pt/Blog/por-que-eles-querem-mudar-o-cdigo-florestal/blog/34640

sábado, 7 de maio de 2011

Aos que virão depois de nós (Bertolt Brecht)

Eu vivo em tempos sombrios.
Uma linguagem sem malícia é sinal de
estupidez,
uma testa sem rugas é sinal de indiferença.
Aquele que ainda ri é porque ainda não
recebeu a terrível notícia.

Que tempos são esses, quando
falar sobre flores é quase um crime.
Pois significa silenciar sobre tanta injustiça?
Aquele que cruza tranqüilamente a rua
já está então inacessível aos amigos
que se encontram necessitados?

É verdade: eu ainda ganho o bastante para viver.
Mas acreditem: é por acaso. Nado do que eu faço
Dá-me o direito de comer quando eu tenho fome.
Por acaso estou sendo poupado.
(Se a minha sorte me deixa estou perdido!)

Dizem-me: come e bebe!
Fica feliz por teres o que tens!
Mas como é que posso comer e beber,
se a comida que eu como, eu tiro de quem tem fome?
se o copo de água que eu bebo, faz falta a
quem tem sede?
Mas apesar disso, eu continuo comendo e bebendo.


Eu queria ser um sábio.

Nos livros antigos está escrito o que é a sabedoria:
Manter-se afastado dos problemas do mundo
e sem medo passar o tempo que se tem para
viver na terra;
Seguir seu caminho sem violência,
pagar o mal com o bem,
não satisfazer os desejos, mas esquecê-los.
Sabedoria é isso!
Mas eu não consigo agir assim.
É verdade, eu vivo em tempos sombrios!

II

Eu vim para a cidade no tempo da desordem,
quando a fome reinava.
Eu vim para o convívio dos homens no tempo
da revolta
e me revoltei ao lado deles.
Assim se passou o tempo
que me foi dado viver sobre a terra.
Eu comi o meu pão no meio das batalhas,
deitei-me entre os assassinos para dormir,
Fiz amor sem muita atenção
e não tive paciência com a natureza.
Assim se passou o tempo
que me foi dado viver sobre a terra.

III

Vocês, que vão emergir das ondas
em que nós perecemos, pensem,
quando falarem das nossas fraquezas,
nos tempos sombrios
de que vocês tiveram a sorte de escapar.

Nós existíamos através da luta de classes,
mudando mais seguidamente de países que de
sapatos, desesperados!
quando só havia injustiça e não havia revolta.

Nós sabemos:
o ódio contra a baixeza
também endurece os rostos!
A cólera contra a injustiça
faz a voz ficar rouca!
Infelizmente, nós,
que queríamos preparar o caminho para a
amizade,
não pudemos ser, nós mesmos, bons amigos.
Mas vocês, quando chegar o tempo
em que o homem seja amigo do homem,
pensem em nós
com um pouco de compreensão.

terça-feira, 3 de maio de 2011

Aldo Rebelo diz que cedeu sobre APPs para garantir votação do novo Código Florestal


Publicado em maio 3, 2011 por HC
Relator abre mão da redução do tamanho de APPs às margens de rios e do fim da exigência de mata nativa em topos de morros e encostas. Segundo ele, ainda falta consenso sobre um ponto do texto, que é a definição de reserva legal para propriedades de até quatro módulos fiscais.
Com o objetivo de garantir a votação, nesta quarta-feira (4), do projeto que altera o Código Florestal (PL 1876/99 e outros), o deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) abriu mão de alguns pontos polêmicos que constavam da primeira versão de seu parecer. Entre eles, o tamanho da Área de Preservação Permanente (APP) às margens de rios e a exigência de mata nativa em topos de morros e encostas. Aldo explicou nesta segunda-feira, porém, que ainda falta consenso com o governo sobre a definição da reserva legal em pequenas propriedades.
Em relação às APPs às margens de rios, o primeiro substitutivo pretendia reduzir de 30 para 15 metros essa área no caso de córregos – menos de 5 metros de largura. O novo texto mantém as faixas atuais da mata ciliar, que variam de 30 metros, para rios de até 10 metros de largura; a 500 metros, para rios com largura superior a 600 metros.
Um acordo permitiu que, apenas no caso de APPs já devastadas às margens de rios de até 10 metros, o agricultor ou morador da área será obrigado a reconstituir a mata ciliar pela metade, ou seja, 15 metros. Nos demais casos, a APP deve ser mantida integralmente, o que, segundo Aldo Rebelo, trará prejuízos para a agricultura.
Ele argumentou que, nos rios São Francisco ou Xingu, por exemplo, se persistir a obrigatoriedade de preservar 500 metros de mata ciliar, “a pequena agricultura vai deixar de existir”. Para resolver a questão, ele informou que os órgãos ambientais estudam a possibilidade de permitir alguma atividade de baixo impacto nessas áreas, que não inviabilizem completamente sua utilização.
Aldo também devolveu ao texto a exigência de preservação de mata nativa nos topos de morros, encostas e áreas acima de 1,8 mil metros de altitude. Essas serão áreas de utilização restrita, segundo explicou. Algumas atividades, como cultivo de maçã, café, uva e pastoreio extensivo, poderão ser desenvolvidas, assim como outras definidas pelos órgãos ambientais.
Reserva legal
No ponto que resta de divergência com o governo, Aldo Rebelo informou que quer manter em seu substitutivo a determinação de que as propriedades de até quatro módulos fiscais possam declarar como reserva legal apenas as matas nativas de que dispunham em julho de 2008, sem obrigatoriedade de recomposição das áreas utilizadas em desacordo com a legislação até aquela data.
O governo, ao contrário, quer que todos os proprietários sejam obrigados a recompor as áreas usadas irregularmente. O relator argumentou que não há condições para que os pequenos produtores rurais recomponham essas áreas porque não têm espaço disponível. “Também não há como compensarem porque eles não dispõem de recursos para isso”, acrescentou.
No caso da retirada das APPs do cálculo da reserva legal, proposta por Aldo, o governo cedeu. Ficou mantida no texto a previsão de cálculo da reserva apenas a partir da área que excede quatro módulos fiscais. “Do contrário, podemos prejudicar aquele que tem um pouco mais que isso”, explicou.
As duas partes também concordaram em permitir a compensação de áreas atualmente utilizadas em desconformidade com a lei em qualquer parte do território brasileiro, desde que no mesmo bioma. Hoje a lei condiciona essa possibilidade à mesma bacia hidrográfica e ao mesmo estado. A compensação poderá ainda ser feita na forma de consórcio ou em parques nacionais que ainda não foram pagos pelo governo.
Reportagem – Maria Neves e José Carlos Oliveira
Edição – Maria Clarice Dias
Reportagem da Agência Câmara de Notícias, publicada pelo EcoDebate, 03/05/2011
[ O conteúdo do EcoDebate é “Copyleft”, podendo ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, ao Ecodebate e, se for o caso, à fonte primária da informação ]

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Casa ou quartel?


Reitoria da UFRGS tenta empurrar goela abaixo regimento que retira direitos dos moradores
Alexandre Haubrich, jornalista e editor do Jornalismo B

Os resíduos bolsonarianos chegaram a Casa do Estudante Universitário da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (CEU-UFRGS). Em silêncio, sem ampla divulgação na comunidade acadêmica, a Reitoria da UFRGS caminha para impor um novo regimento na CEU. “Casa” é um conceito que parece um tanto controverso no tal regimento. Ou você, leitor, não pode andar sem camisa dentro de sua casa? E consumir bebidas alcoólicas em casa, você pode? Mesmo que o local onde você mora seja alugado? “Que escândalo!”, urrariam os redatores do novo regimento.

Pois é, os estudantes maiores de idade que moram na Casa do Estudante da UFRGS podem ser impedidos de circular sem camisa ou beber nas dependências. Um moralismo antiquado que chega a ditatorial quando consideramos que nada disso foi – nem a Reitoria tenciona que seja – debatido com os moradores. Se o atual regimento nem existe legalmente – há anos a CEU é organizada através de regras regimentais não formalizadas – a proposta de mudança que a Reitoria tenta emplacar retira direitos até de participação dos estudantes na gestão da Casa. Segundo o blog Megafonadores,

Este novo regimento, além de ter sido elaborado sem a participação dos estudantes, é um retrocesso no que tange a gestão da casa. Se aprovado, a CEU não possuirá um conselho gestor com participação dos moradores. Tirando o direito dos alunos de, de forma representativa, deliberarem sobre questões de sua própria moradia.

Os moradores reclamam também de expulsões arbitrárias e de vigilância excessiva, que, para eles, configura a tentativa de “implementação de uma política de controle e repressão sobre os estudantes que necessitam de políticas de promoção social e não da criminalização e exclusão”. Outra questão prejudicial aos moradores se refere às novas regras para a permanência na Casa após a graduação. Hoje, é permitido que os formados continuem ali por até seis meses, prazo que pode ser reduzido para 60 dias. A política de estímulo à permanência na universidade, defendida pela Reitoria, também seria esvaziada, com o fim da permissão para alunos de pós-graduação morarem na CEU.

Localizada na avenida João Pessoa, uma das principais vias de Porto Alegre, a Casa do Estudante da UFRGS é, atualmente, o lar doce lar de 400 estudantes. Mas a doçura pouco tem a ver com a estrutura oferecida pela universidade. A quantidade de pias e fogões não supre a demanda, há infiltrações no oitavo andar e a segurança contra incêndios é criticada pelos moradores. Além disso, o segundo andar, antes ocupado por moradias, foi transformado em espaço da administração, para departamentos que antes ficavam no prédio da Secretaria de Assistência Estudantil. Essa medida, obviamente, reduz a quantidade de vagas oferecidas para moradia.

Esses e outros problemas estruturais, somados à tentativa de retirada de direitos e de imposição antidemocrática de um novo regimento, levaram os estudantes ao Campus Central da universidade, para protestar e propor um regimento alternativo. Ainda segundo o Megafonadores, “o Secretário de Assistência Estudantil, Edilson Nabarro, resolveu sair para conversar com os estudantes. Recebeu as reivindicações, mas não se comprometeu com nada. Disse não estar impondo esse novo regimento, mas também não quis saber do regimento elaborado e proposto pelos moradores da casa”.

O regimento informalmente em vigor pode ser lido AQUI.

A “proposta” da Reitoria pode ser lida AQUI.

A contra-proposta dos estudantes / moradores pode ser lida AQUI.

Mais informações no blog da CEU.

A República da Farinha – o momento dos grandes partidos políticos brasileiros


A atuação dos partidos políticos brasileiros hoje pode ser explicada através da farinha. Já tivemos o Ciclo do Açúcar, o Ciclo do Ouro, o Ciclo do Café. Tivemos até a versão político-institucional mais chique, mais cheia de fricotes, o café-com-leite, assim com hífen e tudo. Pois hoje vivemos o Ciclo da Farinha. De sacos diferentes, mas ainda assim farinha.

Peguemos os mais encorpados partidos do país e vejamos se a farinha não é o elemento comum entre eles, se não é ela quem norteia os rumos da política nacional. A farinha, unida a doses variáveis de fermento, é a receita geral, ainda que um ou outro mestre-cuca da alta elite culinária prefira a farinha que passarinho não come.

O PSDB segue a receita da vovó estrangeira, que vem e volta ao Brasil de acordo com suas conveniências, mas não gosta muito daqui. De qualquer forma, ela está sempre em contato, enviando sua mais nova receita aos filhinhos tucanos, nova receita que é sempre a mesma. Está caduca ou apenas quer fixar bem seus ingredientes na nossa cabeça? Bondosa. Fato é que o contato é sempre através de cartas, para que venha junto seu cheiro de enxofre, tão agradável ao olfato das aves de bico longo que habitam essas paragens.

A receita do PSDB baseia-se, teoricamente, em fazer o bolo crescer para depois dividir. Mas, cozinheiros amadores que somos, sabemos que em qualquer casa que se preze quem está na cozinha acaba por decidir o quanto quer comer. Se muitos estão ajudando a fazer o bolo, muitos comem, irremediavelmente. Se poucos se fecham a sete chaves na cozinha, fazem um bolo enorme e comem tudo sozinhos.

Mas não veja no PSDB ou em sua avó estrangeira muita criatividade. Com problemas para manter o peso, os tucanos pouco mais fizeram do que deixar mais light a receita usada pelo seu primo DEM, receita essa criada pela querida vovó deste último, a Dona Arena. Essa rigorosa senhora passou a tal receita para o seu filho, o PFL, que repassou para o DEM. Os passos são mais ou menos semelhantes aos da receita do PSDB, mas, para fazer o bolo como prefere o DEM, bata bastante. O bolo da Dona Arena  também tem um gosto um tanto adstringente: enrola a língua do vivente, dificulta a fala. E é preciso comê-lo com cuidado, sem estardalhaço e com um ritual determinado anteriormente pelo cozinheiro. Caso contrário o cidadão ficará chocado com o que pode acontecer.

O PT, por sua vez, nunca teve muitas condições financeiras para comer bolo. Comia terra, mas comiam todos. Desde 2001, essa realidade mudou. O PT ascendeu à classe média, e ganhou até o direito a fazer seu próprio bolo. Fez, faz, e tem distribuído os pedaços para mais gente. Mas não deixa mais ninguém entrar na cozinha, e a receita, que pegou emprestada do PSDB, ganhou apenas um pouco mais de açúcar.

E o PMDB? Bom, esse não sabe cozinhar, mas come o que vier. E pede para repetir.

Alexandre Haubrich, jornalista e editor do blog Jornalismo B (http://jornalismob.wordpress.com)

Manifesto: Acre e o novo Código Florestal


Publicado em maio 2, 2011 por HC
Compartilhe:
Contextualizando o tema da proposta de substituição do Código Florestal, é de se destacar, inicialmente, que o Estado do Acre tem como estratégia de longo prazo transformar a base produtiva do Estado, favorecendo sistemas de produção sustentáveis que estejam de acordo com a vocação e a capacidade de suporte dos recursos a serem utilizados, como indicado pelo nosso Zoneamento Econômico e Ecológico do Estado – ZEE. Nesta perspectiva, a sociedade acreana, há mais de uma década, identificou a possibilidade de reversão do padrão anterior de desmatamento e degradação do solo mediante alteração da estratégia de indução econômica, fundamentando-a numa proposta de desenvolvimento sustentável e tendo por base os cinco critérios de sustentabilidade: o ambiental, o social, o econômico, o político e o cultural.
A base legal para a formulação do modelo de desenvolvimento sustentável é o atual Código Florestal, que prevê a preservação de amplas áreas de valor ambiental nas propriedades privadas, criando condições para o desenvolvimento do manejo florestal e do aproveitamento econômico da floresta em pé. As políticas públicas estaduais se sustentam no referido Código, na forma tomada a partir da sua reforma realizada no final da década de 1990.
Todavia, essa reforma decorreu de um contexto de recrudescimento do desmatamento e das queimadas na Amazônia, razão pela qual o governo Fernando Henrique, alterando o Código Florestal de 1965, aumentou de 50% para 80% as áreas de reserva legal na Amazônia. Apesar do amplo apoio social e da opinião pública, esta decisão resultou, por outro lado, em um impacto econômico e social intenso, gerando uma rejeição explícita dos produtores rurais, no que resultou em uma virtual desobediência civil.
Tal fato, se do ponto de vista ambiental foi extremamente positivo, resultou em um problema na realidade diária para uma imensa massa de proprietários rurais, grandes e pequenos: de um dia para o outro, milhares deles passaram a ter um “passivo ambiental”, o qual deveria ser recuperado ou compensado, nos termos da Medida Provisória que consubstanciou a reforma.
Instantaneamente, diversos proprietários, que haviam realizado desmatamentos legais até o limite de 50%, passaram a ser obrigados a respeitar, na área situada entre os 50% e os 80%, as restrições de uso típicas da Reserva Legal, surgindo a obrigação, inclusive, de recuperação ou compensação dessas áreas. Diante da incapacidade do setor, naquela época, vislumbrar a possibilidade de exploração econômica sustentável dos 80% da floresta existente na reserva legal, por meio de manejo florestal, por exemplo, a edição da MP resultou em uma forte reação à nova norma.
Essa rejeição arrastou-se por mais de uma década, havendo poucos avanços. O Estado do Acre, excepcionalmente, soube articular um grande arranjo com os movimentos sociais, setor produtivo e instituições públicas, de maneira a pactuar e fortalecer, com sucesso, uma Política de Valorização do Ativo Ambiental Florestal, que objetiva, dentre outras coisas, regularizar o passivo ambiental das propriedades rurais em seu território, tema que tem se constituído como um dos maiores desafios para uma gestão socioambiental que promova a eqüidade e a sustentabilidade das atividades produtivas rurais.
Com base na atual estrutura legal brasileira, em especial o Código Florestal, o Acre, por meio da Política supra-referida, tem fomentado ações integradas entre a sociedade civil, ONGs e instituições governamentais, em busca da melhoria da qualidade de vida dos produtores rurais – pequenos, médios e grandes – assim como proteção do meio ambiente. Desta forma, desde o ano de 2008, foram editadas diversas normas que criaram planos e programas que buscam viabilizar atividades econômicas sustentáveis, onde a produção florestal e rural, a regularização das propriedades e a proteção ambiental possuam uma dinâmica integrada e harmônica. São exemplos dessa proposta o programa de certificação das unidades produtivas rurais, o programa de florestas plantadas, o programa de regularização do passivo ambiental e, em especial, mais recentemente, a criação do Sistema de Incentivo a Serviços Ambientais, com possibilidade de pagamento de créditos de carbono e valorizando a floresta em pé.
Dessa forma, considerando os estudos do Zoneamento Econômico-Ecológico do Estado, o Estado do Acre reduziu a reserva legal, para efeito de recomposição, para até 50%1, o que resolveu mais 70% das irregularidades ambientais no Estado. Ao mesmo tempo, organizou um mecanismo articulado de alternativas para resolução dos cerca de 30% de passivo restante, permitindo aos produtores, concomitantemente, a recomposição de reserva legal por meio da regeneração da floresta, plantios florestais, compensação com outras áreas e por meio da desoneração, inclusive com inovador sistema de uso do Fundo Florestal estadual para regularização de áreas em Unidades de Conservação2. Em outros termos, considerando os programas estaduais que buscam valorizar a floresta em pé, coordenados com um adequado sistema de resolução do passivo ambiental, em um grande pacto considerando diversos atores e interesses da sociedade, do estado e do mercado, demonstrou-se, na prática, a possibilidade de soluções baseadas no marco legal vigente.
Por outro lado, é de se reconhecer alguns aspectos legítimos ainda a serem discutidos em nível federativo, como em relação aos produtores que, antes da Medida Provisória de 1998, estavam legalmente regulares e que, do dia para a noite, passaram a ter um passivo ambiental. Há também aspectos relacionados ao uso sustentável das Áreas de Preservação Permanente – APPs, a criação de alternativas econômicas para a recuperação da reserva legal, novas alternativas de regularização ambiental, a desburocratização dos processos, bem como a consolidação da produção familiar no país, que merecem ser ouvidas.
Mesmo que se considere esses últimos elementos, e talvez alguns pontos do Código Florestal de fato justificassem ajustes, a proposta de total substituição do Código por novas regras não se justifica. Na verdade, em relação ao PL, verificou-se que dos 53 artigos propostos pelo projeto, 23 são transcrições do Código de 1965, com pequenos ajustes; 5 são adaptações do Programa Mais Ambiente (Decreto nº 7.029/2009); 4 foram transcritos do Decreto nº 5.975/2006 e 8 regulamentam institutos já existentes no atual Código. O que resta – 13 novos artigos – tem apenas o condão de suspender multas, assegurar a redução de APP, consolidar o uso de áreas já abertas de áreas em Reserva Legal e APP e criar novas modalidades de intervenção em áreas como várzeas, em especial o Pantanal.
Deve ser destacado, por outro lado, que a “regra de ouro” declarada para os defensores da proposta de alteração do código florestal é a “consolidação do uso atual” de áreas de reserva legal e APPs, aliada à suspensão ou impedimento de multas, o que poderá, todavia, gerar situações de interpretações jurídicas que permitam situações absurdas. Como exemplo, utilizando todas as possibilidades de regularização trazidas pela proposta de novo Código, em um caso extremo, uma propriedade pode ser regularizada ambientalmente sem a manutenção de qualquer vegetação nativa, sendo seu proprietário anistiado de todas as multas existentes.
Primeiramente, pode ser verificado que a suspensão das multas pode se dar pelo tão-só ingresso em programa de regularização ambiental (art. 24, caput e § 4º, do PL), eliminando sanções por ações como desmatamento ilegal, inclusive em reserva legal e APP. Já a legitimação do uso de todas as áreas abertas pode se dar pela utilização de três mecanismos distintos: a) a previsão de desnecessidade de recomposição ou compensação de áreas desmatadas de propriedades com os 50% de florestas existentes anteriormente a 1998 (art. 49 do PL), adicionada da utilização do “bônus” universal de quatro módulos fiscais para compensação de reserva legal, previsto no art. 28 do PL (Bônus o qual, no Acre, pode chegar a 400 ha). Por fim há a previsão de consolidação do uso das APPs abertas – ainda que, neste caso, com muito mais rigor e condicionantes do que a liberação da reserva legal (art. 25, § 1º).
Em síntese, a aplicação dos dispositivos acima mencionados pode significar, em tese, que uma propriedade seja ambientalmente regularizada e suas multas transformadas em “serviços ambientais” sem que tenha preservado uma árvore sequer em toda a sua área, em razão da aplicação dos dispositivos legais acima mencionados, concomitantemente à não imposição de multas por eventuais ilegalidades (art. 24, § 3º, do PL).
Relativamente à “anistia” das multas, pode-se dizer que é baseada em iniciativas como a do “Mais Ambiente”, onde as ações de recuperação ambiental de reserva legal e de APPs são “convertidas” em serviços ambientais, considerando-se tal atividade como pagamento das multas. Porém, em um novo contexto normativo, onde grande parte das obrigações de recuperação ambiental são eliminadas, sob o argumento da “consolidação” do uso de áreas já ocupadas, essa conversão de multas em serviços ambientais pode perder o sentido. Isso porque não há como se eliminar o dever de recuperar e as áreas ilegalmente ocupadas e se anistiar a multa ao mesmo tempo, devendo-se escolher ou um, ou outro.
Assim, ainda que o projeto de lei siga de fato o princípio anunciado pelos “ruralistas” de consolidação das áreas já ocupadas e não de abertura de novas áreas para desmatamento, as regras dessa consolidação também geram situações de injustiça, em prejuízo para os interesses coletivos, como visto mais acima.
Além, até mesmo a regra da “consolidação” é relativizada no projeto, pois a estratificação da reserva legal na Amazônia entre 20%, 35% e 80% (art. 13 do PL) – a depender do tipo de vegetação – significa a permissão de desmatamentos em maiores áreas quando se encerrar a moratória de cinco anos prevista no art. 47. Igualmente, a redução da APP significa mais áreas liberadas cujas áreas também poderão ser suprimidas. Não se deve esquecer, ainda, da possibilidade de desmatamentos decorrentes de licenças já concedidas ou solicitadas até a promulgação da lei (art. 47, § 2º do PL).
Nesse sentido, a proposta apresentada constitui-se como um apanhado de textos do próprio Código Florestal atual, ao qual se agregou normativas como decretos federais e resoluções do CONAMA, dentre outros, em um arranjo o qual vai gerar a necessidade de alterações em regras ambientais nos três níveis de governo, afetando leis e decretos estaduais, resoluções de conselhos, portarias e instruções normativas dos órgãos ambientais que demorarão muitos anos para serem adaptados, em um gigantesco custo de tempo e dinheiro para a sociedade, sem se considerar os custos indiretos, como os judiciais, decorrentes dos quase certos questionamentos das novas regras, que levarão ao menos uma década até que sejam planificados pelos tribunais superiores.
Em síntese, não obstante o reconhecimento da importância de parte dos anseios de produtores rurais, interesses esses que podem ser legitimamente debatidos pela sociedade e as instituições, há necessidade de revisão de diversos aspectos presentes no projeto de lei 1.876/1999, que busca substituir o atual Código Florestal, na forma como aprovada por comissão da Câmara dos Deputados no dia 6 de julho de 2010. Tal afirmação decorre da verificação de aspectos que podem representar a consolidação de situações ilegais e abusivas de uso da terra, de forma injusta com os cumpridores da legislação, bem como em razão da possibilidade de liberação, no futuro, de mais áreas para desmatamento na Amazônia.
Assim, dentre diversos aspectos que devem ser rediscutidos na proposta do novo Código Florestal, exemplifica-se a questão da estratificação da reserva legal na Amazônia, a alteração das regras de medição da APP, a concessão de um bônus universal de quatro módulos fiscais para regularização da reserva legal e, por fim, a anistia de multas concomitante à redução das obrigações de recuperação e recomposição florestal.
Como alternativas às propostas apresentadas, propõe-se, para contemplar necessidades legítimas dos setores produtivos, a dispensa de recomposição ou compensação aos imóveis com percentual de vegetação de acordo com a lei em vigor à época da supressão da vegetação, a regulamentação da Cota de Reserva Florestas – instituída como mais uma alternativa para solução do passivo ambiental -, a criação de programas estaduais de regularização ambiental, a criação de incentivos financeiros e tributários para atividades ambientalmente sustentáveis, o apoio à valorização da floresta em pé – por meio de incentivo a serviços ambientais, por exemplo – dentre diversas outras iniciativas.
A verdadeira solução, portanto, decorrerá da mudança do modelo produtivo na Amazônia, que hoje favorece uma economia que só reconhece valor nas áreas sem florestas. Deve-se estabelecer políticas públicas inovadoras e transparentes, baseadas na produção de baixo carbono, constituindo-se novos arranjos financeiros que possam desenvolver ambientes de negócios baseados na manutenção da floresta e, assim, se alcance o cumprimento do grande desafio desse século, que é fazer o encontro entre economia e ecologia.
Nesse sentido, políticas públicas adequadas que garantam o financiamento de atividades sustentáveis na Amazônia, a construção e implementação do ZEE nos estados, a generalização da assistência técnica e extensão rural, a intensificação da produção, o desenvolvimento de novos produtos e serviços de baixo carbono e a geração de conhecimentos inovadores na área constituem-se em uma obrigação ética de nossa geração, o que representará soluções muito mais duradouras para o desenvolvimento econômico da Amazônia e para preservação de seus ativos ambientais e serviços ecossistêmicos.
Em conclusãoanalisando o substitutivo para criação do novo Código Florestal aprovado em Comissão do Congresso Nacional, manifestamo-nos contrários a uma série de mecanismos nele previstos, em especial no que se refere à:
1) redução da reserva legal na Amazônia em áreas de cerrado e campos gerais, previsto no § 1º, do art. 13. Recomenda-se não realizar a estratificação da reserva legal no bioma, considerando que representará a disponibilização de enormes áreas para novas queimadas e desmatamentos, com impactos em áreas de relevante valor da biodiversidade.
2) exigência da recomposição ou compensação somente de passivos ambientais superiores a quatro módulos ficais, conforme previsão do art. 28.
Considerando que na região amazônica os quatro módulos fiscais podem alcançar a desoneração de até quatrocentos hectares, esse “bônus” generalizado para todo e qualquer proprietário rural poderá representar, no Estado do Acre, anistias de regularização de centenas de milhares de hectares que deveriam ser recuperados com a legislação atual.
3) não-vinculação da anistia de multas a atividades de efetiva recomposição ou compensação florestal, conforme autorizado no art. 24, §§ 3º e 4º. A redução das obrigações de recomposição e compensação não deve ser acumulada com a desoneração das multas. O modelo de conversão de multas em serviços ambientais deve se basear no conceito de aumento da cobertura florestal, o que não é o caso do contido no substitutivo.
4) consolidação de ocupações ilegais em áreas de preservação permanente ocupadas ilegalmente, conforme previsão do art. 24. Há normas do CONAMA3 que trazem critérios para ocupação em APP que já mitigam a rigidez do Código, demonstrando a desnecessidade desta previsão.
5) modificação da regulamentação das áreas de preservação permanente, em especial quanto ao critério de medição e a criação da faixa de 15 metros, nos termos do art. 4º. Recomenda-se a manutenção dos critérios atuais, sob pena de se criar riscos à vida humana, à biodiversidade e à manutenção dos recursos hídricos.
SOS Amazônia
Comissão Pró-Índio do Acre – CPI/AC
Centro dos Trabalhadores da Amazônia – CTA,
Centro de Defesa dos Direitos Humanos e Educação Popular – CDDHEP/AC
Grupo de Trabalho Amazônico – GTA
Grupo de Pesquisa e Extensão em Sistemas Agroflorestais do Acre – PESACRE
WWF Brasil
1 Art. 7º, da Lei Estadual nº 1.904, de 5 de junho de 2007. Disponível em: <www.pge.ac.gov.br/normasambientais>.
2 Decreto Estadual nº 3.416, de 12 de setembro de 2008. Disponível em: Disponível em: <www.pge.ac.gov.br/normasambientais>.
3 Com exemplo, as resoluções CONAMA nº 369, de 28 de março de 2006 e CONAMA nº 425, de 25 de maio de 2010.

EcoDebate, 02/05/2011
[ O conteúdo do EcoDebate é “Copyleft”, podendo ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, ao Ecodebate e, se for o caso, à fonte primária da informação ]